Alan Wilzig é alguém como você e eu. Ele tem uma família, ele adora carros e motos e tem uma pista de corrida com 1,6 quilômetros e 12 metros de largura em seu quintal. Eu disse que ele é como você e eu? Ok, talvez não.
E mesmo assim, quem não consideraria construir um circuito em tamanho real se tivesse a chance? Pois então, Wilzig, o filho de um sobrevivente do holocausto que transformou US$ 28 em uma fortuna petrolífera durante a década de 1960 e aproveitou para comprar um banco, construiu a pista porque podia.
Para ter uma ideia de quem estamos falando, depois que Wilzig construiu uma casa opulenta (na realidade, um castelo) em Hamptons no ano de 1997 (talvez você conheça a região do desafio de carros de luxo do Top Gear EUA), um repórter do New York Times perguntou se ele havia se esquecido de alguma coisa – um brinquedo, algum detalhe, qualquer coisa. “Nada”, ele disse. “Se tivéssemos pensado em algo, teríamos feito.”
Arrogante? Talvez para alguns; mas não muda a realidade. Wilzig tem os recursos para imaginar e construir coisas a seu bel prazer. Formado na escola Wharton, Wilzig dobrou o valor do banco de seu finado pai, o The Trust Company of New Jersey, para formar uma fortuna familiar de nove dígitos quando o North Fork Bankcorp o comprou em 2004.
E assim, quando se decidiu, no mesmo ano, por construir um circuito privado em um terreno de 275 acres (1,1 km2) que comprou em Taghkanic, no estado de Nova Iorque, tudo o que Wilzig precisou foi de um guardanapo, uma caneta e algumas boas ideias. Fã de motocicletas e piloto da IMSA Lights, ele quis um lugar onde pudesse usar e abusar de sua coleção de carros, karts e motos, e ainda treinar para as provas da IMSA.
Buscando inspiração para seu projeto de US$ 7,5 milhões, Wilzig conheceu o Ascari Race Resort do bilionário holandês Klaas Zwart, com sede em Marbella na Espanha. O local atende pilotos amadores e profissionais, além de matar a sede por trackdays do próprio Zwart. Wilzig chamou ainda o ex-piloto e instrutor de provas de motovelocidade Keith Code, que o convenceu de que o que realmente era necessário era uma curva em inclinação.
“NASCAR é basicamente o único tipo de corrida que não assisto”, disse Wilzig, ”mas a [curva] inclinada acabou se tornando a curva favorita de todos. Minha filha de quatro anos a chama de ‘curva maluca’”.
Eu o perguntei se “tomou” outras curvas de circuitos famosos, uma prática comum entre projetistas de pistas. ”Não tentei recriar nenhuma curva específica. Mas talvez estivesse pensando nos esses em VIR [Virginia International Raceway] quando fizemos estas?” pergunta ele, apontando para um conjunto de curvas na parte de trás da pista durante uma volta. “Talvez, um pouco”.
Assim, com um plano definido, Wilzig começou a construir seu circuito dos sonhos, em conformidade, segundo ele, com as leis de zoneamento da cidade. E então uma casa decimal a mais quase colocou tudo abaixo. Alguns vizinhos descobriram que um complexo automobilístico de “US$ 75 milhões” estava sendo construído, e começaram a protestar. O número exagerado surgiu de um erro de digitação em um artigo no New York Post, e mesmo uma correção não conseguiu acalmar a oposição. E assim, Wilzig passou a segunda metade da década brigando com um grupo de vizinhos furiosos, que se organizaram sob o nome de The Granger Group (o grupo granjeiro).
Depois de altos e baixos, o órgão responsável pela região decidiu em 2006 que o circuito proposto do Wilzig não se encaixava nas leis de zoneamento de Taghkanic. Wilzig então enviou uma proposta separada, que definia o uso do circuito como “recreacional”, uma diferença técnica sutil. O conselho de zoneamento aprovou, mas em 2010, um juiz de apelação reverteu essa decisão.
A essa altura, Wilzig tinha um circuito de nível profissional com o formato das garras de uma lagosta, mas sem asfalto, com uma liminar contra seu término. Uma derrota para os Grangers na Suprema Corte do estado de Nova Iorque atrasou ainda mais o projeto.
E então, no começo de 2011, a Corte de Apelação do estado de Nova Iorque decidiu em favor de Wilzig, permitindo que completasse o projeto. “Minha ‘vingança’ é ficar calado para que pareçam verdadeiros imbecis ao fazer tanto escândalo”, ele declarou a um repórter local.
Apesar de não ter uma reta longa de alta velocidade, o impecável circuito de Wilzig – com zebras brancas e laranjas para combinar com as cores de sua equipe – tem nove curvas serpenteando por mais de 21 metros de mudanças de elevação. O resultado é um traçado técnico, que pode ser usado em diversas configurações, tanto em sentido horário quando anti-horário.
A curva mais marcante realmente é a inclinada, que sobe um morro natural. É uma tigela de verdade, na qual o piloto deve começar a três quartos do topo e mergulhar para o centro, se aproximando do ápice para sair com aceleração máxima. Outra curva difícil, mas bem feita, é um S em uma subida que termina subitamente. Assim como o saca-rolha em Laguna Seca, Wilzig explica, se você enxerga para onde está indo, já é tarde demais.
Um bom traçado pela longa curva de 180 graus permite pisar fundo e cortar os dois esses na sequência. Essa parte foi projetada originalmente para ser uma reta só, mas Keith Code convenceu Wilzig a quebrá-la para ficar mais interessante. A última curva antes da reta principal é uma curva em descida com ângulo decrescente que exige paciência, mas que recompensa com uma reta de 200 km/h no final.
Assim, a Wilzig Racing Manor (mansão automobilística de Wilzig), como é chamada, é o maior circuito zoneado para uso recreacional privado nos Estados Unidos. Há ainda no local uma casa de campo, um museu para a coleção de carros e motos de Wilzig e uma oficina para seus carros da IMSA e karts (incluindo um equipado com motor rotativo capaz de 50 cavalos e 200 km/h). Sua coleção é assunto para outro dia.